Bonapartismo, fascismo e guerra (Último artigo de Leon Trotsky)

 


Leon Trotsky

 

Bonapartismo, fascismo e guerra¹

(Último artigo de L. Trotsky)²

 

 Introdução dos Editores da Fourth International

O camarada Trotsky nunca viu este artigo escrito. Ele o ditara em seu ditafone, como era seu costume, parte dele apenas como anotações para elaboração posterior. Seções adicionais viriam mais tarde, e o todo seria consideravelmente revisado, alguns parágrafos totalmente cortados, outros colocados em outros pontos do manuscrito e assim por diante. Pois, ao contrário do mito popular e apesar de sua enorme produção, Trotsky não escreveu com facilidade. O que se segue é, portanto, uma tradução literal da transcrição feita por seu estenógrafo russo a partir dos registros ditados por Trotsky. Apesar de sua forma inacabada, no entanto, este artigo está entre as contribuições mais importantes de Trotsky. Mais precisa e nitidamente do que em qualquer outro lugar, ele estabeleceu aqui a lei histórica de que o fascismo só tem sucesso depois da radicalização das massas e depois que a vanguarda proletária não conseguiu conduzir as massas radicalizadas à conquista do poder. A profunda importância desse conceito, especialmente para os trabalhadores dos Estados Unidos, ficará clara para todo leitor sério. Editores da Fourth International 

 

Em seu artigo muito pretensioso, confuso e estúpido ["National Defense: The Case of socialism", Partisan Review, julho-agosto de 1940], Dwight Macdonald tenta atribuir a nós a visão de que o fascismo é simplesmente uma repetição do bonapartismo. Teria sido difícil inventar bobagens maiores. Analisamos o fascismo em seu desenvolvimento, em suas várias etapas, e trouxemos um ou outro de seus aspectos para o primeiro plano. Existe um elemento de bonapartismo no fascismo. Sem esse elemento, ou seja, sem a elevação do poder do Estado acima da sociedade devido a um aguçamento extremo da luta de classes, o fascismo teria sido impossível. Mas observamos desde o início que se tratava fundamentalmente do bonapartismo da época do declínio imperialista, que é qualitativamente diferente daquele da época da ascensão da burguesia. Em seguida, diferenciamos o bonapartismo puro como um prólogo a um regime fascista. Porque no caso do bonapartismo puro o governo estava próximo do poder do rei...

Na Itália do pós-guerra, a situação era profundamente revolucionária. O proletariado teve todas as oportunidades [de tomar o poder]. [A burguesia esperava, a princípio, impedir a ditadura do proletariado por um regime de Bonaparte chefiado por Giolotti. Mas este regime revelou-se instável e deu lugar a forças fascistas recrutadas nas fileiras da pequena burguesia]. 

[Da mesma forma com] os ministérios de Brüning, Schleicher e a presidência de Hindenburg na Alemanha e o governo de Petáin na França³, mas todos eles se mostraram, ou devem se provar, instáveis. Na época do declínio do imperialismo, um bonapartismo, um bonapartista puro é completamente inadequado; é essencial para o imperialismo mobilizar a pequena burguesia e esmagar o proletariado com seu peso. O imperialismo só é capaz de cumprir essa tarefa se o próprio proletariado revelar sua incapacidade de conquistar o poder, enquanto a crise social leva a pequena burguesia ao paroxismo.

A gravidade da crise social advém do fato de que com a concentração dos meios de produção, ou seja, o monopólio dos trustes, a lei do valor, o mercado não é mais capaz de regular as relações econômicas. A intervenção do Estado torna-se uma necessidade absoluta. Na medida em que o proletariado ....

A guerra atual, como afirmamos em mais de uma ocasião, é uma continuação da guerra anterior. Mas uma continuação não significa uma repetição. Como regra geral, uma continuação significa um desenvolvimento, um aprofundamento, uma agudização. Nossa política, a política do proletariado revolucionário, em relação à segunda guerra imperialista é uma continuação da política elaborada durante a guerra imperialista anterior, fundamentalmente sob a liderança de Lenin. Mas uma continuação não significa uma repetição. Também neste caso, uma continuação significa um desenvolvimento, um aprofundamento e uma agudização.

 

Fomos apanhados desprevenidos em 1914

  Durante a guerra passada, não só o proletariado como um todo, mas também a sua vanguarda e, de certo modo, a vanguarda da vanguarda, foram apanhados desprevenidos. A elaboração dos princípios da política revolucionária em relação à guerra começou quando a guerra já havia explodido totalmente e a máquina militar exercia um domínio ilimitado. Um ano após a eclosão da guerra, a pequena minoria revolucionária ainda era compelida a se acomodar a uma maioria centrista na conferência de Zimmerwald[4]. Antes da Revolução de Fevereiro, e mesmo depois, os elementos revolucionários não se viam como candidatos ao poder, mas como representantes da oposição de extrema esquerda. Até Lenin relegou a revolução socialista a um futuro mais ou menos distante... Se Lenin via a situação assim, então não acreditamos que seja necessário falar dos outros. Ele escreveu na Suíça: 

[Nós, os homens mais velhos, talvez não vivamos o suficiente para ver as batalhas decisivas da revolução iminente.][5]

  Esta posição política da extrema esquerda expressou-se de forma mais gráfica sobre a questão da defesa da pátria.

Em 1915, Lenin referiu-se nos seus escritos sobre as guerras revolucionárias que o proletariado vitorioso teria de travar. Mas era uma perspectiva histórica indefinida e não uma tarefa para amanhã. A atenção da ala revolucionária estava voltada para a questão da defesa da pátria capitalista. Os revolucionários naturalmente responderam negativamente a esta pergunta. Isso estava completamente correto. Mas enquanto esta resposta puramente negativa serviu de base para propaganda e treinamento dos quadros, ela não conseguiu conquistar as massas, que não queriam um conquistador estrangeiro.

Na Rússia, antes da guerra, os bolcheviques constituíam quatro quintos da vanguarda proletária, isto é, dos trabalhadores que participavam da vida política (jornais, eleições etc.). Após a Revolução de fevereiro, o controle ilimitado passou para as mãos dos defensores, mencheviques e socialistas-revolucionários[6]. É verdade que os bolcheviques, no lapso de oito meses, conquistaram a esmagadora maioria dos trabalhadores. Mas o papel decisivo nesta conquista não foi desempenhado pela recusa em defender a pátria burguesa, mas pela palavra de ordem "Todo o poder aos Sovietes!" E apenas essa palavra de ordem revolucionária! A crítica ao imperialismo, o seu militarismo, o repúdio à defesa da democracia burguesa etc., nunca poderiam ter levado a esmagadora maioria do povo para o lado dos bolcheviques. Em todos os outros países beligerantes, exceto na Rússia, a ala revolucionária no final da guerra [ainda apresentou palavras de ordem negativas].

Na medida em que o proletariado se mostra incapaz, em determinado momento, de conquistar o poder, o imperialismo passa a regular a vida econômica com seus próprios métodos; o mecanismo político é o partido fascista, que se tornou o poder estatal.  As forças produtivas estão em contradição irreconciliável não apenas com a propriedade privada, mas também com as fronteiras do Estado nacional. O imperialismo é a expressão dessa contradição. O capitalismo imperialista busca resolver essa contradição por meio da extensão das fronteiras, da conquista de novos territórios e assim por diante. O Estado totalitário, subordinando todos os aspectos da vida econômica, política e cultural ao capital financeiro, é o instrumento para criar um Estado supranacional, um império imperialista, o domínio sobre os continentes, o domínio sobre o mundo inteiro.

Analisamos todos esses traços do fascismo, cada um por si e todos na sua totalidade, na medida em que se manifestaram ou vieram para o primeiro plano.

 

O ponto em que o fascismo é bem-sucedido

Tanto a análise teórica como a rica experiência histórica do último quarto de século demonstraram com igual força que o fascismo é, em todas as oportunidades, o elo final de um ciclo político específico que é composto do seguinte: a crise mais grave da sociedade capitalista; a crescente radicalização da classe trabalhadora; o crescimento da simpatia para com a classe trabalhadora e um desejo de mudança por parte da pequena burguesia urbana e rural; a extrema confusão da grande burguesia; suas manobras covardes e traiçoeiras destinadas a evitar um resultado revolucionário; o esgotamento do proletariado; crescente confusão e indiferença; o agravamento da crise social; o desespero da pequena burguesia, seu desejo de mudança, a neurose coletiva da pequena burguesia, sua rapidez em acreditar em milagres; sua prontidão para medidas violentas; o aumento da hostilidade para com o proletariado que frustrou suas expectativas. Estas são as premissas para a rápida formação de um partido fascista e sua vitória.

É evidente que a radicalização da classe trabalhadora nos Estados Unidos passou apenas deu seus primeiros passos, quase exclusivamente no campo do movimento sindical (C.I.O). O período pré-guerra, e depois a própria guerra, podem interromper temporariamente esse processo de radicalização, especialmente se um número significativo de trabalhadores for absorvido pela indústria bélica. Mas essa interrupção do processo de radicalização não pode ser de longa duração. A segunda etapa de radicalização assumirá um caráter mais nitidamente expressivo. O problema de formar um partido de trabalhadores independente será colocado na ordem do dia. Nossas propostas de transição ganharão grande popularidade. Por outro lado, as tendências fascistas reacionárias vão se retirar para um segundo plano, assumindo uma posição defensiva, esperando um momento mais favorável. Esta é a perspectiva mais próxima. Nada é mais indigno do que especular sobre se teremos sucesso ou não na criação de um poderoso partido revolucionário dirigente. Há uma perspectiva favorável à vista, o que justifica o ativismo revolucionário. É preciso aproveitar as oportunidades que se abrem e construir o partido revolucionário.

A questão do poder é colocada aos trabalhadores

A Segunda Guerra Mundial coloca a questão da mudança de regime de forma mais imperiosa, mais urgente do que a Primeira Guerra. É acima de tudo uma questão de regime político. Os trabalhadores estão cientes de que a democracia está afundando em todos os lugares e que o fascismo os ameaça mesmo em países onde o fascismo ainda não existe. A burguesia dos países democráticos usará naturalmente este medo do fascismo sentido pelos trabalhadores, mas, por outro lado, a falência das democracias, seu colapso, sua transformação indolor em ditaduras reacionárias, obriga os trabalhadores a colocar o problema do poder diante deles, torna-os suscetíveis a levantar a questão.

A reação exerce atualmente um poder como talvez nunca tenha existido na história moderna da humanidade. Mas seria um erro imperdoável ver apenas reação O processo histórico é contraditório. Sob o manto da reação oficial, processos profundos estão ocorrendo entre as massas que estão acumulando experiência e se tornando receptivas a novas perspectivas políticas. A velha tradição conservadora do Estado democrático, que foi tão poderosa mesmo durante a época da última guerra imperialista, existe hoje apenas como uma sobrevivência extremamente instável. Na véspera da última guerra, os trabalhadores europeus tinham partidos numericamente poderosos. Mas na ordem do dia foram colocadas reformas, conquistas parciais e de forma alguma a conquista do poder.

A classe trabalhadora americana ainda hoje não tem um partido operário de massas. Mas a situação objetiva e a experiência acumulada dos trabalhadores americanos podem, em muito pouco tempo, levantar a questão da conquista do poder. Essa perspectiva deve ser a base de nossa agitação. Não se trata apenas de uma posição sobre o militarismo capitalista e de renunciar à defesa do Estado burguês, mas de se preparar diretamente para a conquista do poder e a defesa da pátria proletária.

Os stalinistas não podem aparecer à frente de uma nova ascensão revolucionária e arruinar a revolução como fizeram na Espanha e anteriormente na China? Evidentemente, não é adequado excluir tal possibilidade, por exemplo na França. A primeira vaga da revolução, muitas vezes, ou mais corretamente sempre, levou ao topo os partidos da "esquerda" que conseguiram não se desacreditar totalmente no período anterior e que têm uma grande tradição política por trás deles. Assim, a Revolução de Fevereiro levou ao poder os mencheviques e os socialistas-revolucionários, que eram adversários da revolução na véspera. Assim, a Revolução Alemã de novembro de 1918 levou ao poder os sociais-democratas, oponentes irreconciliáveis ​​dos levantes revolucionários.

Doze anos atrás, Trotsky escreveu em um artigo publicado pela The New Republic:

Nenhuma outra época na história do homem foi tão saturada de antagonismos como a nossa. Sob uma alta tensão de classe e antagonismos internacionais, os "fusíveis" da democracia "explodem". Esta é a essência do curto-circuito da ditadura. Claro, os “interruptores” mais fracos cedem primeiros. Mas o poder das contradições internas e globais não se enfraquece por isso: pelo contrário, aumenta. E é duvidoso que sejam apaziguados, visto que até agora o processo só atingiu a periferia do mundo capitalista. A gota [artrite gotosa] começa no dedo mínimo da mão ou no dedão do pé, mas uma vez que se instala, segue direto para o coração. ["Onde vai a Rússia?", The New Republic, 22 de maio de 1929.]

 

Os protestos dos filisteus americanos

Isso foi escrito na época em que a democracia burguesa de cada país acreditava que o fascismo só era possível em países atrasados ​​que ainda não haviam se formado na escola da democracia. O conselho editorial da The New Republic, que na época não havia sido favorecido com as bênçãos da GPU, acompanhou o artigo de Trotsky com um de sua autoria, tão característico do filisteu americano médio que citaremos suas passagens mais interessantes.

Devido às suas desventuras pessoais, o líder russo exilado mostra uma notável capacidade para análises abstratas; mas sua abstração é a de um marxismo rígido, e parece-nos que lhe falta uma visão realista da História, justamente aquilo que ele mais se orgulha. Sua noção de que a democracia é uma forma de governo, adequada apenas para tempos bons, mas incapaz de resistir às tempestades das contradições internas ou internacionais, pode ser apoiada (como ele parcialmente admite) apenas tomando como exemplo os países onde a democracia está apenas em seu fraco começo, e países, além disso, nos quais a Revolução Industrial mal começou.

Mais adiante, o conselho editorial de The New Republic rejeita o exemplo da democracia de Kerensky na Rússia Soviética e as razões pelas quais ela não resistiu ao teste das contradições de classe e teve que dar lugar a uma perspectiva revolucionária. O periódico sabiamente escreve:

A fraqueza de Kerensky foi um acidente histórico, que Trotsky não pode admitir porque não há lugar em seu esquema mecanicista para tal coisa.

Assim como Dwight Macdonald, The New Republic acusa os marxistas de serem incapazes de entender a História de forma realista por causa de sua abordagem mecanicista e ortodoxa dos eventos políticos. The New Republic era da opinião de que o fascismo é produto do atraso do capitalismo e não de sua excessiva maturidade. Na opinião desse jornal (opinião que, repito, era a da esmagadora maioria dos filisteus democratas), o fascismo é o destino que aguarda os países burgueses atrasados.

O sábio conselho editorial nem mesmo se deu ao trabalho de pensar por que era uma convicção universal no século XIX que os países atrasados deviam se desenvolver ao longo do caminho da democracia. Em todo caso, nos antigos países capitalistas, a democracia surgiu em uma época em que o nível de seu desenvolvimento econômico não estava acima, mas abaixo do desenvolvimento econômico da Itália moderna. E mais, naquela época a democracia representava a principal via do desenvolvimento histórico que todos os países percorriam um a um, os atrasados ​​seguindo os mais avançados, e às vezes os precedendo. Nossa época é, ao contrário, a do colapso da democracia. Além disso, esse colapso começa nos elos mais fracos, mas gradualmente se espalha para aqueles que pareciam fortes e invencíveis. Desse modo, o método ortodoxo ou mecanicista, ou seja, o método marxista de análise dos acontecimentos, nos permitiu prever o curso dos processos com muitos anos de antecedência. Pelo contrário, a abordagem realista de The New Republic era a de um gatinho cego. The New Republic seguiu sua atitude crítica em relação ao marxismo caindo sob a influência da mais revoltante caricatura do marxismo, ou seja, o stalinismo.

 

A mais nova safra dos filisteus

Muitos dos filisteus da nova safra baseiam seus ataques ao marxismo no fato de que, contra o prognóstico de Marx, o fascismo se estabeleceu em vez do socialismo. Nada é mais vulgar e estúpido do que esta crítica. Marx demonstrou e provou que quando o capitalismo atinge um certo nível, a única saída para a sociedade está na socialização dos meios de produção, ou seja, o socialismo. Também mostrou que, por causa da estrutura de classes da sociedade, só o proletariado é capaz de resolver essa tarefa em uma luta revolucionária intransigente contra a burguesia. Também mostrou que, para cumprir esta tarefa, o proletariado precisa de um partido revolucionário.

Durante toda a sua vida, Marx, e junto com ele e depois dele Engels, e depois deles Lenin, travou uma batalha irreconciliável contra aquelas características dos partidos proletários que obstruíam a solução da tarefa revolucionária histórica. A intransigência da luta liderada por Marx, Engels e Lenin contra o oportunismo, por um lado, e o anarquismo, por outro, mostra que eles não subestimaram este perigo. Em que consiste este último? O oportunismo dos dirigentes da classe operária, sujeitos à influência burguesa, poderia obstruir, retardar, dificultar, adiar o cumprimento da tarefa revolucionária do proletariado.

É precisamente essa condição da sociedade que estamos observando agora. O fascismo não veio de forma alguma "no lugar" do socialismo. O fascismo é a continuação do capitalismo, uma tentativa de perpetuar sua existência usando as medidas mais bestiais e monstruosas. O capitalismo teve a oportunidade de recorrer ao fascismo apenas porque o proletariado não realizou a revolução socialista a tempo. O proletariado ficou paralisado no cumprimento desta tarefa devido à atitude dos partidos oportunistas. A única coisa que se pode dizer é que se apresentaram mais obstáculos, mais dificuldades, mais etapas no caminho para o desenvolvimento revolucionário do proletariado do que os fundadores do socialismo científico anteciparam. O fascismo e a série de guerras imperialistas constituem a terrível escola em que o proletariado tem que se libertar das tradições e preconceitos pequeno-burgueses, tem que se livrar dos partidos oportunistas, democráticos e aventureiros, tem que forjar e treinar a vanguarda revolucionária e desta forma se preparar para a solução da tarefa sem a qual não há, e não pode haver, qualquer salvação para o desenvolvimento da humanidade.

Eastmam[7] chegou à conclusão de que a concentração dos meios de produção nas mãos do Estado põe em risco sua "liberdade" e, portanto, decidiu renunciar ao socialismo. Essa anedota merece ser incluída em um volume sobre a História da ideologia. A socialização dos meios de produção é a única solução para o problema econômico em uma determinada etapa do desenvolvimento humano. A demora em resolver este problema leva à barbárie fascista. Todas as soluções intermediárias empreendidas pela burguesia com a ajuda da pequena burguesia sofreram um fracasso miserável e vergonhoso. Tudo isso é secundário para Eastman. Ele percebeu que sua "liberdade" (liberdade de confundir, liberdade de permanecer indiferente, liberdade de passividade, liberdade de diletantismo literário) estava sendo ameaçada por vários lados, e imediatamente decidiu aplicar sua própria medida: renunciar ao socialismo. Surpreendentemente, essa decisão não teve influência em Wall Street ou nos sindicatos. A vida seguiu seu próprio caminho, como se Max Eastman ainda fosse um socialista. Pode-se estabelecer como regra geral que quanto mais impotente é um radical pequeno-burguês, especialmente nos Estados Unidos, mais [firmemente ele se apega à sua "liberdade"].

 

O fascismo não venceu na França

Na França, não há fascismo no sentido verdadeiro do termo. O regime senil do Marechal Pétain representa uma forma senil de bonapartismo da época do declínio imperialista. Mas esse regime também se revelou possível apenas depois que a prolongada radicalização da classe trabalhadora francesa, que levou à explosão de junho de 1936, não conseguiu encontrar uma saída revolucionária. A Segunda Internacional e a Terceira, o charlatanismo reacionário da "Frentes Popular", enganou e desmoralizou a classe trabalhadora. Após cinco anos de propaganda em favor de uma aliança de democracias e de segurança coletiva, após a repentina passagem de Stalin para o lado de Hitler, a classe trabalhadora francesa foi pega desprevenida. A guerra provocou uma desorientação terrível e um estado de espírito de derrotismo passivo ou, para ser mais correto, indiferença diante de um beco sem saída. Dessa cadeia de circunstâncias emergiu uma catástrofe militar sem precedentes e, em seguida, o desprezível regime de Pétain.

Precisamente porque o regime de Petain é um bonapartismo senil, ele não contém nenhum elemento de estabilidade e pode ser derrubado por um levante revolucionário de massas muito mais cedo do que um regime fascista.

 

Especialmente importante para trabalhadores dos EUA

Em toda discussão política surge inevitavelmente a questão: conseguiremos criar um partido forte quando a crise chegar? O fascismo não chegará na nossa frente? Uma etapa fascista não é inevitável? Os sucessos do fascismo facilitam a perda de todas as perspectivas, levam ao esquecimento das verdadeiras condições que tornaram possível o seu fortalecimento e triunfo. No entanto, uma compreensão clara dessas condições é especialmente importante para os trabalhadores nos Estados Unidos. Podemos apresentar como uma lei histórica: o fascismo só pode triunfar nos países onde os partidos operários conservadores impediram o proletariado de usar a situação revolucionária para tomar o poder. Na Alemanha houve duas situações revolucionárias: 1918-1919 e 1923-1924[8]. Mesmo em 1929, uma luta direta pelo poder pelo proletariado ainda era possível. Em todos os três casos, a Social-democracia e a Comintern destruíram criminalmente a possibilidade da conquista do poder e, assim, colocaram a sociedade em um impasse. Somente sob essas condições e nesta situação a ascensão tempestuosa do fascismo e sua conquista do poder foram possíveis.



_________________________________________________

1. Traduzimos para o português a partir do Inglês, comparando com as traduções do espanhol e francês públicadas no www.marxists.org. As notas são da publicação em espanhol e as frases acrescentadas em colchetes retiradas da versão em russo, também publicada no www.marxists.org.

2. Publicado pela primeira vez: In Fourth International , Vol. I No. 5, outubro de 1940, pp. 128-131. Trotsky ditou este artículo pouco antes de sua morte, mas não viveu o suficiente para completá-lo e publicá-lo. Apesar de seu carácter incompleto não corresponde a descrição que faz Isaac Deutscher do mesmo (El Profeta Desterrado, p. 502) como "iniciado" ou como um " traço de sua última e inacabada busca em uma nova direção ".

3. Heinrich Brüening (1885-1970): foi chanceler da Alemanha de 1930 a 1932. Não tinha maioria no Reichstag e governava por decreto. Kurt von Schleicher (1882-1934): foi um burocrata militar alemão que serviu como chanceler de dezembro de 1932 a janeiro de 1933, quando Hitler o substituiu. Ele foi uma das vítimas do sangrento expurgo nazista de junho de 1934. Paul von Hindenburg (1874-1934): foi presidente da Alemanha de 1925 a 1934. Embora se apresentasse como um adversário dos nazistas quando derrotou Hitler nas eleições em 1932, nomeou-o chanceler em 1933.

4. Zimmerwald, Suíça, foi o lugar onde ocorreu uma conferência, em setembro de 1915, para reagrupar as correntes internacionalistas e anti-guerra que sobreviveram ao desastre da Segunda Internacional. Embora a maioria dos participantes fossem centristas, foi um passo em frente na direção da nova Internacional. 

5. Aqui, o tradutor inglês acrescentou a seguinte nota: "Várias citações de Lenin durante esse período se encaixam na descrição de Trotsky. Escolhemos duas: 'É possível, entretanto, que cinco, dez e até mais anos passem antes do início da revolução socialista "(de um artigo de março de 1916, Lenin, Complete Works, Vol. XIX, p. 45, terceira edição russa)." Nós, velhos, talvez não vivamos o suficiente para ver as batalhas decisivas da revolução iminente " (relatório sobre a revolução de 1905 dado a estudantes suíços, janeiro de 1917, ibid., p. 357).

6. O Partido Socialista Revolucionário foi fundado na Rússia em 1900, emergindo em 1901-1902 como a expressão política de todas as correntes populistas anteriores; teve a maior influência de todas as forças políticas entre o campesinato antes da revolução de 1917. Sua ala direita foi liderada por Kerensky após a revolução daquele ano.

7. Max Eastman (1883-1969): foi um dos primeiros simpatizantes da Oposição de Esquerda e tradutor de vários livros de Trotsky. Sua rejeição do materialismo dialético na década de 1920 foi seguida pela rejeição do socialismo no final dos anos 1930. Ele se tornou um anticomunista e editor do Reader's Digest.

8. Quando a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial se tornou aparente, um motim naval naquele país se transformou em um movimento revolucionário. Em 8 de novembro de 1918, a República Socialista da Baviera foi proclamada em Munique. Em Berlim, operários e soldados organizaram sovietes e uma delegação de social-democratas solicitou que o chanceler entregasse o governo aos operários. O Império Alemão caiu no dia seguinte. Hindenburg e o Kaiser Wilhelm II fugiram para a Holanda e Ebert tornou-se chefe de um governo provisório em Berlim, que consistia em três social-democratas e três membros do Partido Social-democrata Independente. Novamente em 1923, uma situação revolucionária se desenvolveu na Alemanha devido à severa crise econômica e à invasão francesa do Ruhr. A maioria da classe trabalhadora alemã veio apoiar o Partido Comunista. Mas a liderança do PC vacilou, perdeu uma oportunidade excepcionalmente favorável de dirigir a luta pelo poder e permitiu que os capitalistas alemães recuperassem suas posições antes do final daquele ano. A responsabilidade do Kremlin por essa oportunidade desperdiçada foi um dos fatores que levaram à formação da Oposição de Esquerda Russa no final de 1923.


Comentários